Pular para o conteúdo principal

Impactos da inteligência artificial no direito

Quais os verdadeiros desafios e efeitos da implantação de sistemas inteligentes para os advogados - foto: Pixabay

Quais os verdadeiros desafios e efeitos da implantação de sistemas inteligentes para os advogados?

Carlos Teixeira
Jornalista I Futurista

Imagine a situação. Após anos de convivência, não há mais como manter o seu casamento. A sua ex-alma gêmea, aquela por quem você jurou amor eterno, é apenas “aquele sujeito” ou “aquela mulher”. Pois é. O único caminho agora é o advogado, o intermediário da separação irreversível. Nenhum dos dois pretende abrir mão de direitos imaginados ou legítimos.

Um dos dois liga para um escritório e uma voz de mulher, aparentemente de uma pessoa, mas que gera uma certa dúvida se seria um robô, atende e pergunta: por favor, nos informe se sua separação é amigável ou litigiosa para direcionarmos internamente. Após a resposta ele passa para uma outra pessoa, mas com uma certa voz que gera ainda dúvidas se seria um outro robô, porém, agora, com uma voz masculina.

Será que algo assim acontecerá no futuro? Ou seja, a inteligência artificial por trás de um assistente virtual dará conta de fazer o papel tanto da secretária como do advogado? O consultor e empresário Udo Gollub parece acreditar que sim. Em uma conferência da Universidade da Singularidade, uma meca dos estudos sobre o futuro, em 2016, ele recomendou, com a firmeza dos donos da verdade, que qualquer pessoa que esteja estudando direito pare imediatamente. As previsões, com o tom apocalíptico dos pregadores do fim do mundo, viraram vídeo em português e, em outras línguas, passaram a ser verdade para muito consultor bem intencionado – ou não.

O consultor alega que computadores estão se tornando exponencialmente melhores no entendimento do mundo. Com sistemas de inteligência artificial as pessoas podem conseguir aconselhamento legal. Por enquanto em assuntos mais ou menos básicos, dentro de segundos, com 90% de exatidão se comparado com os 70% de exatidão quando feito por humanos. “Nos Estados Unidos, advogados jovens já não conseguem empregos. Haverá 90% menos advogados no futuro, apenas especialistas permanecerão”, previu o consultor.  Mas será tão profundo assim?

Desconfie dos apocalípticos

Dados disponíveis e projeções de estudos mais sérios, com métodos e fontes, contestam o tom excessivamente alarmista. O Departamento do Trabalho dos Estados Unidos projeta um crescimento de 8% nos empregos para advogados até 2026. Há um reconhecimento sobre a concorrência crescente, especialmente por conta do grande número de formandos. Mas a expansão segue a média de outras ocupações profissionais.

Um outro estudo, de dois professores da Universidade de Oxford, na Inglaterra, reforça o exagero das previsões do consultor Udo Gollub.  De acordo com o relatório “O Futuro do Emprego: Quão suscetíveis são os empregos para a informatização?”, de Carl Benedikt Frey e Michael A. Osborne, a probabilidade de automação de empregos de advogados é de apenas 3,5%. Os autores examinaram a suscetibilidade dos empregos à informatização de 702 ocupações detalhadas.

Vale concordar com a previsão de impactos da automação sobre funções de apoio. Especialmente, eliminação de tarefas gerada pela força da inteligência artificial sobre processos rotineiros. Para o estudo de Oxford, 41% dos funcionários prestadores de serviços ao judiciário correm, de fato, risco de sobrevivência. Os trabalhadores envolvidos com funções como preparação de documentos legais e correspondência, como intimações, reclamações, moções e intimações, ou auxiliares em pesquisas jurídicas, têm 93% de risco de sumir do cenário do trabalho.

Um estudo recente da McKinsey & Co estima que 23% do tempo do advogado é automatizável. Pesquisas similares feitas por Frank Levy, do MIT, e Dana Remus, da Faculdade de Direito da Universidade da Carolina do Norte, concluem que apenas 13% do tempo dos advogados pode ser realizado por computadores.

Dúvidas recorrentes

Previsões carregadas de excessos, seja de otimismo ou pessimismo, são inevitáveis. O que sugere cuidados especiais de análise. Mas é um fato que a inteligência artificial terá grande impacto sobre as atividades da profissão e dos escritórios de advocacia.

Kingsley Martin,um dos fundadores da KMStandards, empresa que desenvolveu um software capaz de analisar automaticamente os acordos legais e criar padrões de contrato, afirma que não é possível fazer uma avaliação do impacto da IA ​​sem ter uma compreensão da prática do direito e da tecnologia. “Embora os estudos referenciados tenham avaliado as atividades dos advogados e as tecnologias atuais, eles não envolvem suficientemente os futuros estados da tecnologia”, afirma.

Não é possível banalizar a previsão de estados futuros da inteligência artificial, em síntese. No campo profissional, a maioria dos sistemas de IA depende de alguma forma de supervisão humana. Para Kingsley Martin, o impacto na profissão e sua capacidade de respostas dependem de dois fatores: porcentagem de trabalho suscetível à automação e velocidade de mudança. Ou seja, tudo requer método.

Impactos da inteligência artificial

A inteligência artificial será uma ferramenta de grande importância para as atividades relacionadas com o levantamento de informações e na elaboração de contratos e na identificação de tendências para cada tipo de causa. Em geral tarefas que exigem muita coleta de dados, trabalho com muita informação e certa previsibilidade das tarefas. Em síntese, funções rotineiras que, nem por isso, vai dispensar a interação com um humano. Imagine a causa do início deste texto. Um casal que inicia um processo litigioso de separação. O responsável ou a responsável pela contratação do apoio jurídico terá de interagir com alguém para explicar a sua demanda. Pense bem. Será necessário explicar se há um filho envolvido ou não, por exemplo, bens existentes, interesses de cada parte, negociações que podem surgir entre as partes, informações relevantes para influenciar as decisões, etc.

A inteligência artificial será o recurso capaz de investigar e dar respostas ágeis sobre casos semelhantes e decisões adotadas a partir das informações coletadas. Interação com gente é, por sinal, um dos principais fatores determinantes para se saber se alguma profissão será afetada no futuro pelas inovações tecnológicas. Pense bem se você, ao contratar um advogado, se sentiria confortável preenchendo um formulário ou conversando com uma assistente virtual, que também é um produto da inteligência artificial.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Como ser um jornalista na internet

Para ser um jornalista online, você precisa conhecer quatro "coisas". Um designer. Um programador de sistemas. Uma empresa capaz de valorizar profissionais capacitados e de dar bons empregos para vocês três. E o mais importante: saber muito sobre comunicação e marketing e um pouco sobre design e tecnologia. Esta deve - ou deveria - ser a resposta padrão para pergunta freqüente feita por jornalistas, novos e antigos, interessados em atuar no novo mercado criado pela internet. Muitos deles imaginam que as portas digitais serão abertas por algum curso sobre as inúmeras tecnologias desenvolvidas para o desenho e gerenciamento de sites. "Tenho muita vontade de atuar em jornalismo na internet, e estou fazendo um curso de Dreamweaver", anunciam os abnegados candidatos a emprego minimamente digno nesta praia de muitas ondas nem sempre boas para surfar. Outros, constrangidos, contam em segredo: eu queria muito trabalhar na internet, mas não sei nada de informática. Menos imp

Quem matou o jornalista

Zélia Leal Adghirni A mídia não reflete a opinião pública. A sociedade pensa uma coisa e a mídia fala outra. E o pior: muitas vezes seleciona e reproduz só aquilo que coincide com os interesses políticos e econômicos do momento. O alerta foi dado pelo professor e pesquisador americano da Universidade do Colorado, Andrew Calabrese, durante o 29º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Intercom), que reuniu, na semana passada, mais de três mil professores, alunos e pesquisadores em comunicação na Universidade de Brasília em torno do tema Estado e Comunicação. Calabrese fez graves criticas à mídia americana que, segundo ele, exagerou no patriotismo em detrimento da informação após os atentados de 11 de setembro de 2001. De acordo com o professor, o discurso da Casa Branca e da grande mídia passou a ser quase unificado. A mídia quis fazer uma demonstração de patriotismo e solidariedade e acabou abraçando a decisão do governo de invadir o Iraque sem o respaldo da opinião da opinião

Jornalistas serão substituídos por robôs?

Os jornalistas podem - e vão - ser substituídos por robôs?